⁵ "Levou Abrão consigo a Sarai, sua mulher, e a Ló, filho de seu irmão, e todos os bens que haviam adquirido, e as pessoas que lhes acresceram em Harã."
Pelo que aprendemos com Estevão, em seu sermão, houve dois chamados para Abraão. A família se desloca, em bloco, de Ur, dos caldeus, sua terra natal.
O curso natural percorria a região denominada "Crescente Fértil", exatamente por situar-se em meio a desertos, assim como tratar-se de uma rota definida por abundante vegetação.
Por ela, saindo da Mesopotâmia, área entre os rios Tigre e Eufrates, subia-se para noroeste, até se percorrer uma curva à esquerda pela Síria, em direção ao litoral da Palestina.
Mas todos se alojam em Harã. Este é o nome do irmão caçula de Abrão e Naor. Ele falece em Harã, certamente a razão de chamarem por seu nome esse lugar. Morte de irmão caçula muito entristece a todos.
E foi ali que Deus efetivou o segundo chamado: "Sai da tua terra e da tua parentela". A família antiga, desse período, formava um clã, em tudo muito unido. Portanto, abandonar, sair desse contexto também era doloroso.
E foi o que Abrão fez. Ir para uma terra ainda a ser indicada, embora as promessas, se mal entendidas, animassem o ego de qualquer um, Abrão e todos os que o acompanham decidiram partir.
Essas "pessoas que lhe acresceram em Harã", certamente não haviam acompanhado o clã de Tera, o patriarca, pai dos meninos Abrão, Naor e Harã, desde Ur. Agregaram-se ao clã por razões diversas.
Para prestar serviços, por exemplo. Tanto Abrão, quanto o sobrinho Ló, filho do falecido irmão Harã, eram pastores de gado. Quem peregrina, não planta. Todo o produto da pecuária itinerante serve tanto para o sustento, quanto para o comércio com povos sedentários avizinhados pelo caminho.
Esses agregados deveriam cuidar da variedade de gado que conduziam, da manutenção das tendas, da cultura do couro e das peles, da arte do vestuário e outros artesanatos, enfim, tudo o que pudesse tanto suprir, quanto ser material de comércio.
O fato é que esses agregados confiavam que o que Abrão tinha em mente também seria útil e bom para eles. Muito provavelmente alguns, mais atentos, enxergassem a fé que conduzia Abrão.
Também somos agregados de Abrão. O efeito do chamado dele ainda perdura. Mais do que seguir Abrão e suas intenções, seguimos o Deus dele. Abraão, "pai de muitas nações", é o nosso "pai da (ou em) fé".
O autor de Hebreus diz que esse tal visionário Abraão morreu sem obter a plenitude do que lhe foi prometido. Apenas contemplou de longe. Esse mesmo autor define fé como algo que não se vê. Certeza do que se espera (apenas se espera) e convicção do que nunca se viu.
Abrão atendeu ao chamado, à sua vocação, porque é Deus que faz a promessa. Porque é Deus quem chama. Porque é pela fé em Deus. Por isso que esse mesmo autor anônimo escreve: "sem fé, é impossível agradar a Deus".
Ló, o sobrinho filho de Harã, alvo de todo o privilégio, apesar do exemplo explícito do tio, abandonou todas as virtudes decorrentes da fé. Expôs toda a sua família à cultura maldita de Sodoma, porque "armou suas tendas na direção de Sodoma".
Ló foi sequestrado, numa invasão de reis em Canaã, essa terra da peregrinação, mas Abrão o resgatou, empresariando mercenários numa estratégia de guerrilha contra os reis invasores.
Ló, numa querela de seus pastores de gado com os de seu tio, obteve uma decisão preferencial a seu favor, da parte do fleumático Abraão, desta vez conciliador, beneficiando flagrantemente o sobrinho, que tinha como no lugar de filho.
Mas a escolha que ele fez, após o benefício dessa decisão do tio, de armar tendas na direção oposta da fé, aproximou-o, perigosamente, da cidade de perdição de quase toda a sua família.
As filhas que lhe ficaram, após a destruição de Sodoma, sobrinhas netas de Abraão, nada tinham da fé de seu tio avô, certamente porque nunca viram os efeitos dela flagrantes na vida de seu pai. Se Ló, um dia, foi convertido à fé de seu tio, manteve-a tão escondida, que mal serviu a ele próprio.
Uma oração emergencial do tio salvou Ló, literalmente, como que através do fogo. Deus enviou anjos, sempre uma exceção, nas Escrituras, para literalmente, de novo, sacar à força Ló e o que restou de sua família. Até a esposa renunciou ao resgate, ficando literalmente, mais uma vez, pregada ao solo de Sodoma.
Agregados (e congregados, ao contrário de Ló), tornemos à fé e à tomemos por padrão. E sejamos exemplo dela. Ainda que estejamos dentro de Sodoma. No mundo atual, Sodoma não é apenas uma cidade, mas todo o planeta.
Há um chamado e uma vocação de fé, para seguirmos nesta peregrinação. A tenda, permanentemente, armada é a igreja, essa congregação da qual nunca devemos nos afastar. Para não correr o mesmo risco de Ló e toda a sua família: armar tendas espúrias na direção da cultura corrompida.
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