Admira-me. Esta palavra, que aparece em Gálatas 1,6, revela a surpresa, na forma de um susto brutal, de um impacto, em Paulo, que gera sua motivação para escrever a carta.
Extasia-se da rapidez com que os gálatas, na opinião dele, estavam se deixando levar por influência alheia:
⁶ "Admira-me que estejais passando tão depressa daquele que vos chamou na graça de Cristo para outro evangelho". Gl 1.
Na verdade, antes de mergulhar no texto da carta, vale a pena refletir sobre essa facilidade humana de ser enredado por um fascínio qualquer. Aliás, essa pergunta é feita pelo apóstolo:
¹ "Ó gálatas insensatos! Quem vos fascinou a vós outros, ante cujos olhos foi Jesus Cristo exposto como crucificado?" Gl 3.
É, pois, essa facilidade de que qualquer argumento barato ou qualquer displicência de bom senso distraia a nossa atenção para o evangelho.
Esse "admira-me" de Paulo deve nos alertar de como é fácil que, vejam bem, nós mesmos, nem são os outros, que nada conhecem do valor do evangelho, mas nós mesmos menosprezarmos e nos deixarmos levar por um fascínio qualquer. Esta palavra, no original, é feitiço, engodo maligno.
Ora, talvez nem precisa ser assim tão malignamente elaborado, mas a impressão que se tem é que, de um modo geral, uma grande quantidade de crentes, tenho medo de dizer, a maioria, tem conferido ao evangelho uma importância menor, secundária em sua vida, talvez uma reserva supersticiosa.
Por desinteresse, desconhecimento, ou até mesmo descaso. Presença física na igreja, somente, cumprimento das funções burocráticas, como a tal "equipe de louvor", uma assistência dispersiva ao culto, talvez ensaios nos conjuntos ou grupos corais, mas alimento sólido, nenhum.
Presença simbólica na Escola Dominical, ausência nos Estudos Bíblicos, distração na hora da mensagem. Em casa, no lhufa-lhufa do dia a dia, Bíblia não entra na agenda e orações, somente se houver uma emergência associada a medo, doença ou um "capricho de oração" incontido.
Paulo vai detalhar o fenômeno, denunciando ser com rapidez que se deixam demover da graça de Cristo para outro evangelho. Voltará ao assunto da graça. Aqui, ele reafirma a originalidade do evangelho.
Há vários "evangelhos". Talvez uma falta de reverência em relação ao verdadeiro, ou o próprio descaso com as Escrituras, a superficialidade e desconhecimento, ou a variada adaptação da tradição cultural cristã aos caprichos deste século.
Tudo isso predispõe vários "evangelhos". Mas não há outro, adverte Paulo, nenhum outro, mas somente o evangelho de Cristo. A palavra no original lembra um distúrbio que falseia a verdade do evangelho bíblico.
A carta aos Gálatas foi escrita para suprir essa falta. Daí sua atualidade. Debruçar-se sobre ela traz à tona a originalidade, a identidade e o potencial do evangelho. Como vai afirmar Paulo aos Romanos, "o evangelho é poder de Deus".
Nenhum comentário:
Postar um comentário