A ruína foi total. Um Êxodo ao contrário. O povo que havia saído do Egito, com promessa de se tornar nação, receber uma terra prometida e tornar sua capital trono de justiça, era levado cativo, desta vez para a Babilônia.
Terra de onde, há mais de um milênio atrás, sairá o patriarca Abrão, tendo vivido em Ur, dos caldeus. Era esse o povo que os levava agora cativos.
A vocação seria esta, caso houvessem permanecido fiéis:
⁵ "Agora, pois, se diligentemente ouvirdes a minha voz e guardardes a minha aliança, então, sereis a minha propriedade peculiar dentre todos os povos; porque toda a terra é minha; ⁶ vós me sereis reino de sacerdotes e nação santa. São estas as palavras que falarás aos filhos de Israel." Ex 19.
E poderia ser ainda pior. Cerca de 130 anos atrás, nesse mesmo movimento, a Assíria havia dispersado as tribos do Norte, praticamente riscado do mapa. Os samaritanos, tão discriminados no tempo se Jesus, foi o que restou desse caldeamento.
Jeremias descreve nas Lamentações o que foi o cerco de Jerusalém, por dois longos anos, sob Zedequias, o último descendente de Davi no trono. Ezequiel pregava no exílio, quando houve o anúncio da queda da cidade. Ez 33:
²¹ "No ano duodécimo do nosso exílio, aos cinco dias do décimo mês, veio a mim um que tinha escapado de Jerusalém, dizendo: Caiu a cidade."
Foi a ruína total dessa cidade. Os profetas de aluguel pregavam que haveria livramento, como sob o assírio Senaqueribe, nos tempos de Isaías, no reinado de Ezequias, em 701 a.C. Mas Jeremias prevenia que, desta vez, não haveria milagre, que vêm quando Deus, e não quando nós queremos.
O livro de Ezequiel começa com ele assentado em meio a esse povo, curtindo todos os contornos dessa ruína:
¹ "Aconteceu no trigésimo ano, no quinto dia do quarto mês, que, estando eu no meio dos exilados, junto ao rio Quebar, se abriram os céus, e eu tive visões de Deus." Ez 1.
As visões de Ezequiel, que percorrem todo o livro, concedem ao profeta tanto a projeção da restauração futura, quanto indicam o diagnóstico do mal que afetou todo o povo.
Desde os tempos de Oseias, profeta que pregou no reino do Norte, no tempo do rei Jeroboão II (782-753 a.C), denunciava-se o declínio, corrupção e falência do sacerdócio em Israel.
Pois em Jerusalém, na época de Ezequiel, no mais interior do Templo, reproduzia-se a mesma falência, uma imitação macabra da idolatria que já havia sido denunciada havia mais de 100 anos, ainda antes do cativeiro assírio do Norte.
A história se repetia. Como descrevia Jeremias, profeta em Jerusalém, contemporâneo de Ezequiel, profeta em Babilônia:
⁸ "Quando, por causa de tudo isto, por ter cometido adultério, eu despedi a pérfida Israel [no cativeiro assírio] e lhe dei carta de divórcio [agora no cativeiro babilônico], vi que a falsa Judá, sua irmã, não temeu; mas ela mesma se foi e se deu à prostituição." Jr 3.
Daí Ezequiel denunciar o flagrante desse absurdo. Aliás, essa figura das duas irmãs que imitam o erro uma da outra, também aparece numa parábola no livro desse profeta:
⁴ "Os seus nomes eram: Oolá, a mais velha, e Oolibá, sua irmã; e foram minhas e tiveram filhos e filhas; e, quanto ao seu nome, Samaria [capital do reino do Norte] é Oolá, e Jerusalém [capital do Reino do Sul] é Oolibá." Ez 23.
A temática das duas irmãs que se prostituem assumindo a idolatria de seus vizinhos foi constantemente denunciada pelos profetas autênticos. Deus revela a Ezequiel o modo oculto como era praticada.
Um anjo do Senhor promove um tour, a partir das entradas externas do Templo de Jerusalém, para mostrar ao profeta o alcance e a força maligna dessa cumplicidade com os ídolos.
⁷ "Ele me levou à porta do átrio; olhei, e eis que havia um buraco na parede. Então, me disse: Filho do homem, cava naquela parede.⁸ Cavei na parede, e eis que havia uma porta.⁹ Disse-me: Entra e vê as terríveis abominações que eles fazem aqui.¹⁰ Entrei e vi; eis toda forma de répteis e de animais abomináveis e de todos os ídolos da casa de Israel, pintados na parede em todo o redor." Ez 8.
O livro de Ezequiel inicia com uma deslumbrante visão da Glória de Deus. O autor de Hebreus destaca essas lembranças, de grandezas típicas do Antigo Testamento, que apontam para uma realidade maior atual.
Por isso, de certa forma, ele descarta uma certa nostalgia desses tempos:
²² "Mas tendes chegado ao monte Sião e à cidade do Deus vivo, a Jerusalém celestial, e a incontáveis hostes de anjos, e à universal assembleia ²³ e igreja dos primogênitos arrolados nos céus, e a Deus, o Juiz de todos, e aos espíritos dos justos aperfeiçoados, ²⁴ e a Jesus, o Mediador da nova aliança, e ao sangue da aspersão que fala coisas superiores ao que fala o próprio Abel." Hb 12.
E Paulo destaca como, na igreja, na face de cada irmão, descortina-se, diante de nós, a glória de Deus: 2 Co 3:
¹⁸ "E todos nós, com o rosto desvendado, contemplando, como por espelho, a glória do Senhor, somos transformados, de glória em glória, na sua própria imagem, como pelo Senhor, o Espírito."
E essa é uma promessa mencionada por Jesus em sua última oração, a chamada "oração sacerdotal":
²² "Eu lhes tenho transmitido a glória que me tens dado, para que sejam um, como nós o somos; ²³ eu neles, e tu em mim, a fim de que sejam aperfeiçoados na unidade, para que o mundo conheça que tu me enviaste e os amaste, como também amaste a mim." Jo 17.
Interessante que o sacerdócio que Deus queria para Isarel, personificado na instrução e modelo do sacerdócio levítico, do qual Oseias e Ezequiel denunciam falência, agora é ordenado como benção à igreja de Cristo.
⁹ "Vós, porém, sois raça eleita, sacerdócio real, nação santa, povo de propriedade exclusiva de Deus, a fim de proclamardes as virtudes daquele que vos chamou das trevas para a sua maravilhosa luz; ¹⁰ vós, sim, que, antes, não éreis povo, mas, agora, sois povo de Deus, que não tínheis alcançado misericórdia, mas, agora, alcançastes misericórdia." 1 Pe 2.
A glória do Senhor, tão estrodosamente descrita nos capítulos iniciais do livro desse profeta, conferiu autoridade a ele, assim como demonstrou que, em Deus, não existe ruína que prevaleça ou não seja restaurada.
E a continuidade de suas visões, no livro, anunciam em que termos e amplitude essa restauração se dará. Porque avança ao longo ds história, cumpre os desígnios de Deus e o coloca como sempre quis, o mais completamente possível perto de nós, numa cidade que já tem um nome:
³⁵ "...e o nome da cidade desde aquele dia será: O Senhor Está Ali." Ez 48.
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