terça-feira, 4 de maio de 2021

Ora, como o evangelho chegou ao Antônio - 1

 Corre um história que minha mãe contou. É como se ouvisse sua voz chamando meu nome. Cid Mauro, Sueli e as duas meninas vão a Cascadura. E foram mesmo, as três mulheres, uma bem miudinha, a outra um pouco maior do que a irmã e a terceira, a mãe, um pouco mais madura.

Parece que houve uma conspiração por parte das irmãs, no sentido de ter aguçada sua curiosidade. A maior das curiosidades, que somente o evangelho provoca. A mãe, sempre muito rigorosa. Professora, como a minha própria mãe. Ora, aliás, foram colegas de como chamavam o Curso Normal, no Nilopolitano, nos idos de 1963, as colegas normalistas.

Bendita curiosidade do evangelho. Queriam conhecer a igreja de tia Dorcas. Ora, mas quantos domingos de sol fomos, minha mãe e eu, a pé, desde os tempos em que morávamos em Cascadura, para a "igrejinha de infância", como diz o hino Igrejinha Antiga, "onde a voz de mamãe a Deus suplicava por mim".

Nessa época das normalistas colegas, eu era da idade da menina mais nova. Encheram-se de curiosidade, querendo sempre mais, sempre muito, sempre muito sério. Era o rigor de d. Sueli. Ah, mas não: nunca admitiria brincadeiras com algo tão sério. Ela era, por tradição, de outra religião. Parece que, nessa santa conspiração, as meninas insistiam em ficar na igrejinha da infância.

Ela dizia, está bem, ficamos, ora, mas se ficamos, porém tem de ser tudo muito sério. E sempre foi. E foi tudo muito rápido e muito urgente. Porque o evangelho não espera. Ele mesmo diz é agora. O dia da salvação é hoje. No hoje de Deus. E foi como num rastilho, que foi alcançando toda aquela família, Sueli e cada irmã dela, e a mais madura de todas, a linda d. Alda, essa, sim, a matriarca de todo o rigor (e todo o bom humor). É muito lindo, é o mais lindo de ver o efeito do evangelho na vida da gente, o modo como cremos, como nele e dele vivemos, o modo como dele testemunhamos.

Vinham as notícias dos efeitos do evangelho no restante da família das três mulheres: a miudinha, a média e a mais madura. Ora, o pai. Para mencionar o pai, fizeram dele, pobre Sergio, outro cúmplice do evangelho. Pobre, não, enriqueceu de vez, não esperou. Há tanta saudade de tanta gente daquela igrejinha. Pois uma delas, ah, meu Pai, como aprendi com aquela gente, uma delas é o rosto do Sérgio, a pessoa do Sérgio, o jeito e os gestos do Sérgio. 

Ora, mas que família! Esses homens que cismam e se apressam logo em ir para casa. Sérgio começou com as filhas e a esposa a não perder, por nada, a igreja. As portas da igreja estão abertas, escancaradas, ara, meu irmão, com o rigor de d. Sueli, com o seu "domínio de turma", não havia atraso.

Não esqueço outra manhã de sol. Oh, meu Pai, aquelas manhãs de sol em Cascadura. Podem achar irônico o nome, sim, podem até achar, mas todo crente já teve Cascadura, só quem amacia é o Espírito, como um óleo milagroso. Como diz Jeremias, o profeta, há médico (e óleo) em Gileade (ou em Cascadura).

Nesa manhã de sol, Sérgio me cercou nos bancos antigos da igrejinha antiga. Fala macia. Também, meu amigo, que homem não tem fala macia com três mulheres em casa, uma miudinha, outra média e aquela mais madura? Diz aí! Pastor, dizia ele, posso lhe falar. Puxa, vindo do Sérgio, qualquer e toda a conversa. Haja curiosidade que o evangelho provoque.

É que eu estou pensando em me batizar. Essa história de batismo eu já conhecia, a mesma conspiração em andamento, quando aquela menina de Sérgio, ela mesma, a de tamanho médio, a mais velha, saiu-se com essa mesma ideia. Enfrentou o rigor de d. Sueli. Meu amigo, para enfrentar o rigor de d. Sueli, só tem duas saídas: ter o mesmo DNA, que era o caso da miudinha e da outra, a média. Ou ser alvo do amor das três, que era o caso do Sérgio.

Sérgio falava baixinho. Era necessário apurar os ouvidos. Com quase ninguém por ali, no velho templo, ele disse: Pastor, é que eu quero me batizar. Sim, eu dizia das meninas. Não me interrompam, que já conto a história de Sérgio. Acho que foi a mais velha, essa que chamo de média, em tamanho, mas Sérgio e Sueli chamaram Simone.

Ela disse, como eu já disse, só com o mesmo DNA para enfrentar Sueli, mãe, eu quero me batizar. Que que isso, menina. Tá pesando que é brincadeira? Não, não estou: por isso mesmo que eu quero. Haja convicção! Pior, quer dizer, melhor foi que a miudinha, que os pais chamaram Patrícia, disse eu também. Pronto, d. Sueli, 2 X 1. Saiu ganhando dessa vez.

Este texto está extenso. Vou contar a história do Sergio no próximo. Mas a conversa de batismo não ficou entre as três, porque vieram me procurar. Prestem atenção: isso tudo ocorreu antes dessa conversa, também miudinha, com Sérgio, sussurrada, com aqueles gestos tímidos, comedidos, desenhando com as mãos, típicos dele. Ora, vocês não sabem como três mulheres com esse DNA domesticam qualquer homem.

Pastor, falou Sueli numa outra manhã de sol bem ali, no corredor entre bancos da igrejinha antiga: Simone me procurou e disse que quer ser batizada. Eu nada falei. Mirei nos olhos das três, primeiro a mãe, a filha média, depois a miudinha. Sim, só falei isso. O que o Sr acha? Só então eu falei, e falei o que diz o manual: é lícito e justo, se ela crê. A menorzinha também falou eu também quero. Sueli, ora, Sueli, só com o olhar sinalizou. Ela se calou (e eu também).

Ficou decidido que batizaríamos a média. A menor, consultei Sueli. O veredito foi que esperasse. O fruto ainda estava meio verde. Não houve nenhuma reclamação, naquela manhã de sol, nem minha e nem da miudinha. Batizamos Simone. Como já preveni, esta história vai longe. Aguardem o segundo texto. Coisas do evangelho. Essa história vai longe e você nem imagina quão longe ela vai.

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