quarta-feira, 19 de julho de 2023

Aconchego do Senhor

 

"Senhor, o meu coração não é orgulhoso e os meus olhos não são arrogantes. Não me envolvo com coisas grandiosas nem maravilhosas demais para mim. De fato, acalmei e tranquilizei a minha alma. Sou como uma criança recém-amamentada por sua mãe; a minha alma é como essa criança. Ponha a sua esperança no Senhor, ó Israel, desde agora e para sempre!" Salmo 131.

    Costuma-se, de modo impróprio e inoportuno, criticar-se teólogos. Cuide-se, pimeiro, de lhes não atribuir infalibilidade. Mas nem de si pretendem.

   Ou afirmar-se que qualquer um seja um deles. Fidelidade à palavra, método e espiritualidade os formam. As Escrituras nos apresentam perfis de vários deles. Menciono, por exemplo, Timóteo, aluno de outro, que foi Paulo.

   E o terceiro ponto é que estejam privados da soberba. E para tanto, na oração acima, o salmista espelha esse antídoto.

   Com sinceridade, ele afirma para Deus, não ser tomado por soberba no coração, altivez no olhar e não porfiar pelo que seja alto ou maravilhoso demais.

   Sua primeira virtude é atinar com a simplicidade de Deus. O Altíssimo, justamente assim nomeado, enuncia por boca de Isaías: sim, que "habita num alto e santo lugar" como também "com o contrito e abatido de espírito". 57,15.

    Deus encurta a distância. E grandes coisas ou coisas maravilhosas, no sentido de complicadas de entender, não são a prioridade do Altíssimo. Paulo menciona que Deus desanca a sabedoria deste século, para expor Sua própria.

   E Tiago enumera as características dela: "Mas a sabedoria que vem do alto é antes de tudo pura; depois, pacífica, amável, tratável, cheia de misericórdia e de bons frutos, imparcial e sincera.", 3,17.

    A confissão do salmista revela privar consigo dessa sabedoria. Muito provavelmente uma situação de angústia da alma premeu-o a elevar sua expectativa, porém fora dos propósitos de Deus.

   Aliás, certa vez, quando efetuou um censo em seu reino, Davi foi flagrado focando, sim, coisas demasiadamente grandes para si. Parece ter esquecido de outro verso, por ele mesmo escrito: "O cavalo não garante vitória", Sl 33,7.

     Mas também parece ter aprendido a lição. Que a força não está com o forte. Mas está com o Senhor. Então, instruiu a si mesmo quanto ao que fazer: "Calar e sossegar a alma", do mesmo modo que uma criança mansa ressona após sua mamada.

   Quando imaginamos a personalidade do salmista, avaliamos o quanto foi trabalhoso para Davi agir consigo mesmo desse modo. Mas uma vez que abstraímos, na aplicação do cântico de romagem, para qualquer outro, tomamos como padrão de conduta.

    Não se quer dizer que há puerilidade no que se refere a Deus, tanto se diz que é tão inventado como qualquer deus. Paulo já diz: "Ó, profundidade da riqueza da sabedoria e do conhecimento de Deus! Quão insondáveis são
os seus juízos e inescrutáveis os seus caminhos!
Quem conheceu a mente do Senhor? Ou quem foi seu conselheiro? Quem primeiro lhe deu,
para que ele o recompense?", Rm 11,33-35.

    O salmista se refere a cogitar-se além do que o próprio Deus permite e torna acessível. Deus desvelou-se em Jesus. Não há nada acima, maior ou maravilhoso, mais do que ver Deus no rosto de Cristo.

    Lembramos Felipe, que num assombro, pediu: "Mostra-nos o Pai, e isso nos basta", Jo 14,8. Pois nem mostrar é tal suposição longe de bastar. A fé que se requer nem acontece e nem opera por essa via.

    Era coisa maravilhosa demais. Como Moisés, no deserto, de modo muito mais maduro, desejou ver Deus em sua glória. Maravilhoso demais para ele. E para qualquer um. A não ser para o Filho.

   Ninguém jamais viu a Deus, exceto o Filho, que O viu e O revelou. Ele é o Deus unigênito, no seio do Pai. Deus reservou a Si o direito de semente revelar-se no Filho. O Verbo se fez carne. Vimos a Sua glória, como a do Unigênito do Pai.

    Isso, sim, é maravilhoso. Para além dessa revelação e para além dessa palavra, o salmista não se aventura. A palavra de Deus nos faz calar a alma e sossegar, como a um bebê que se satisfaz no aconchego de sua mãe.

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