terça-feira, 19 de maio de 2020

Lição 8 - A conversão de Paulo - At 9,1-19

At 19,1-19

Saulo, respirando ainda ameaças e morte contra os discípulos do Senhor, dirigiu-se ao sumo sacerdote
e lhe pediu cartas para as sinagogas de Damasco, a fim de que, caso achasse alguns que eram do Caminho, assim homens como mulheres, os levasse presos para Jerusalém.
Seguindo ele estrada fora, ao aproximar-se de Damasco, subitamente uma luz do céu brilhou ao seu redor,
e, caindo por terra, ouviu uma voz que lhe dizia: Saulo, Saulo, por que me persegues?
Ele perguntou: Quem és tu, Senhor? E a resposta foi: Eu sou Jesus, a quem tu persegues;
mas levanta-te e entra na cidade, onde te dirão o que te convém fazer.
Os seus companheiros de viagem pararam emudecidos, ouvindo a voz, não vendo, contudo, ninguém.
Então, se levantou Saulo da terra e, abrindo os olhos, nada podia ver. E, guiando-o pela mão, levaram-no para Damasco.
Esteve três dias sem ver, durante os quais nada comeu, nem bebeu.
Ora, havia em Damasco um discípulo chamado Ananias. Disse-lhe o Senhor numa visão: Ananias! Ao que respondeu: Eis-me aqui, Senhor!
Então, o Senhor lhe ordenou: Dispõe-te, e vai à rua que se chama Direita, e, na casa de Judas, procura por Saulo, apelidado de Tarso; pois ele está orando
e viu entrar um homem, chamado Ananias, e impor-lhe as mãos, para que recuperasse a vista.
Ananias, porém, respondeu: Senhor, de muitos tenho ouvido a respeito desse homem, quantos males tem feito aos teus santos em Jerusalém;
e para aqui trouxe autorização dos principais sacerdotes para prender a todos os que invocam o teu nome.
Mas o Senhor lhe disse: Vai, porque este é para mim um instrumento escolhido para levar o meu nome perante os gentios e reis, bem como perante os filhos de Israel;
pois eu lhe mostrarei quanto lhe importa sofrer pelo meu nome.
Então, Ananias foi e, entrando na casa, impôs sobre ele as mãos, dizendo: Saulo, irmão, o Senhor me enviou, a saber, o próprio Jesus que te apareceu no caminho por onde vinhas, para que recuperes a vista e fiques cheio do Espírito Santo.
Imediatamente, lhe caíram dos olhos como que umas escamas, e tornou a ver. A seguir, levantou-se e foi batizado.
E, depois de ter-se alimentado, sentiu-se fortalecido. Então, permaneceu em Damasco alguns dias com os discípulos.

Introdução 
A conversão de Paulo: como toda e qualquer conversão, demonstração explícita do poder de Deus. Precisamos resgatar o poder desse ato fundante da fé no indivíduo e seu potencial de testemunho e poder, nas mãos de Deus. At 9,15-16.

1. Antecedentes 
     A conversão é o início da vida com Deus. A palavra já indica: homem/mulher são um/uma até o encontro com Deus e, a partir dali, outro/outra. 
    A Bíblia compara, na verdade, define, e não por metáfora, a conversão a um novo nascimento, morte/ressurreição em Cristo e a uma cirurgia pelo poder de Deus. 
    A herança que o ser humano traz de sua ruptura com Deus somente vai resolver-se no retorno a Deus, no ato da conversão. Nela se cumpre a cruz de Jesus Cristo, naquele que crê. 
    Com relação a Saulo de Tarso, vinha alimentando um ódio ativo em relação à igreja. Líder entre os fariseus, em Fp 3,4-7 há um resumo de sua biografia, destacava-se, agora, com pleno sucesso na perseguição ao Caminho. 
    Lucas usa a expressão "assolava", elymaineto, no grego, que significa "ultrajar", "maltratar com violência" ou "provocar estrago". E o ensaio inicial foi perpetrado na morte engendrada de Estêvão. 
     Em At 6,9, entre os membros da Sinagoga que liderou toda a intriga contra Estêvão, estavam "os da Cilícia", ou seja, conterrâneos de Paulo e, sem dúvida, ele incluído.  
     Após a consumação de toda a urdidura, as vestes esfarrapadas e ensanguentadas do mártir foram depositadas pela "testemunhas" forjadas aos pés do jovem Saulo de Tarso, At 7,58: sem dúvida, prestavam conta de uma tarefa finda e bem-sucedida. 
     O jovem apenas não contava que sua queda-de-braço era com o próprio Deus, a quem ele avaliava conhecer e em nome de quem perseguia a igreja de Jesus Cristo.

2. O processo da conversão 
      O impacto da morte de Estêvão teve efeito duplo na vida de Saulo. Enquanto, por um lado, tudo ocorreu conforme planejado, por outro, qualquer relato a respeito da reação da vítima, do sermão ao momento do apedrejamento, enquadraria o jovem algoz em toda a incoerência de tudo o que ocorreu. 
     Saulo era inteligente demais para não levar em conta a contradição entre relato e caráter do diácono Estêvão. Começou a fazer essas duas leituras simultâneas e, como relata, posteriormente, quando fala de sua conversão, era sincero, incrédulo e, ao mesmo tempo, ignorante, em 1 Tm 1,13. Mas não era, absolutamente, ingênuo.
     Colocar os farrapos do que sobrou das roupas de Estêvão aos pés de Saulo simbolizava o fim de um ciclo. Ao mesmo tempo que relatavam a parte em que Saulo não esteve presente, certamente representaram as perguntas pelos detalhes. Isso combinava com a personalidade de Saulo.
     Vejamos como tais respostas, certamente, vão contribuir para o emparedamento e posterior conversão de Paulo.
2.1. Certamente ouviu sobre o sermão de Estêvão. Pelo que conhecemos de Paulo, mesmo antes de sua conversão era inteligente. E a comparação entre a postura que, como autoridades judaicas corruptas, engendraram contra Estêvão e a postura deste, haverá um flagrante contraste que colocará, em xeque, o jovem Saulo, frente a frente com essa contradição, consequentemente, com Deus. 

2.2. Cada detalhe do sermão, sem nenhuma dúvida, Saulo procurou sondar. A leitura de Estêvão, a respeito da tradição judaica, era oposta à leitura que, com todo o zelo, grandeza e vaidade, a "casta" judaica, a que Paulo pertencia com tanto zelo farisaico, também fazia. Por isso, quiseram calá-lo.

2.3. Mas chegou a Saulo cada detalhe do sermão. Com toda a certeza, quem lhe contou, rilhava os dentes, enquanto o jovem Saulo entrava em imperceptível conflito interno. A leitura que Estêvão fazia das Escrituras fazia dele um profeta deslocado no tempo, mas em tudo em dia com sua vocação. 

2.4. Por mais que houvesse rejeição, a clareza da tese de Estêvão, de que, em sua história, Israel tinha um lado obscuro de resistência ao Espírito Santo, representado por lideranças que, como patriarcas, quiseram matar José, rejeitaram ao próprio Moisés e patrocinaram a idolatria, perseguindo e matando os profetas, definitivamente essa era a versão que latejava na mente de Paulo. 

2.5. Internamente, para Saulo que, como qualquer maioral na linhagem farisaica, conhecida a lei de Moisés, conferia a principal afirmação de Estêvão, de que o principal anúncio de Moisés era a profecia sobre o Justo, Jesus, profeta semelhante a ele: rejeitar Jesus, tornar-se "traidor e assassino" dEle, como afirmou Estêvão, At 7,52-53 o que, definitivamente, era não guardar a lei. 

2.6. As testemunhas que deixaram aos pés de Paulo as vestes de Estêvão, prova de que o circuito engendrado desde a farsa previamente montada, At 6,13, correspondeu ao planejado, contrariavam de modo flagrante o nono mandamento, Ex 20,16: "Não dirás falso testemunho contra o teu próximo". Mais uma confirmação do que Estêvão dissera, que todas as autoridades eram uma desonra para a Lei de Moisés, uma afronta e patente contradição. 

2.7. Mas, certamente, o xeque-mate foi quando informaram Saulo da reação final de Estêvão. Nenhuma maldição, Rm 12,14, nenhum impropério proclamado por ele. Até no momento da morte, foi imitador de Jesus, 1 Co 11,1, lições que o futuro apóstolo colocará em prática na sua vida. Estêvão afirmou o que Jesus já havia dito, que estaria na presença de Deus, Mt 26,64, assim como ele vê e enuncia esta cena, At 7,55-56 e ainda, do mesmo modo que Jesus, Lc 23,34, Estêvão rogou a Deus perdão para seus algozes, At 7,59-60.
        Esse testemunho, esse sim, involuntário, dado pelos emissários da Sinagoga ao jovem Saulo, sim, certamente, foi decisivo em sua conversão. Aqui começava, na consciência do futuro apóstolo, a ação dos aguilhões de Deus, At 26,14.
     
3. A última ou primeira viagem 
      Saulo parte da Palestina em direção à Damasco, capital da província romana da Síria, internacionalizando a perseguição contra a igreja. 
     Oficializa por meio de cartas específicas solicitadas ao sumo-sacerdote, destinadas às sinagogas daquela cidade. A influência dos fariseus espalhava-se a partir das sinagogas. 
    Como saiu para esse viagem, está bem expresso e definido por Lucas, em At 9.1, para repetir, naquela capital, At 9,2, o que fizera em seu país, At 8,3, desmembrado famílias, arrastando-as ao cárcere, separando pais e filhos, esposos de suas esposas.
    Vale destacar, no intervalo que se situa em At 8,4-40, a reação da liderança da igreja a essa mesma perseguição:

1. Não se intimidaram: por onde foram dispersos, anunciavam o evangelho, At 8,4;

2. Outro diácono, Felipe, extrapolou sua vocação e, seguindo o e exemplo de Estêvão, além de pregar a palavra, Deus lhe concedeu que operasse os mesmos sinais e prodígios, como sinal profético para ouvir e crer, At 8,5-8;

3. Pedro seguiu a iniciativa de Felipe, interessante como quem definiu a agenda foi o diácono, sinal da operação do Espírito, idepeendentemente de "hierarquia", At 8,14;

4. E essa agenda incluiu Samaria. Não pensem que a resistência e distanciamento preconceituoso e discriminatório entre judeus e samaritanos havia arrefecido. Não foi isso, mas foi a ação do Espírito Santo aproximando e derrubando essa barreira, como Jesus havia ensinado em Jo 4,4, "era necessário" (de novo) passar por Samaria;

5. Aqui é interessante destacar a verdadeira conversão, a respeito do tesoureiro da rainha de Candace, na Etiópia, e a falsa, que foi a simulação do mágico Simão:
5.1. Simão vivia de iludir o povo e, como se vai confirmar, não estava interessado em conversão sincera ou experiência do poder de Deus: queria, apenas, especializar-se, ainda mais, em iludir, At 8,5-9;
5.2. Seus seguidores foram libertos de sua nefasta influência, o que lhe chamou a atenção. Por isso, acercou-se de Pedro e demais apóstolos, que haviam ido em direção ao avivamento em Samaria, orientar Felipe e os novos convertidos, At 8,9-16, para descobrir o "segredo";
5.3. Percebeu Pedro impor as mãos, At 8,18, para que os novos convertidos recebessem o Espírito Santo e, então, achou ser essa o "truque de audiência" que os apóstolos praticavam. Mas os apóstolos não estavam praticando nenhum artifício de mídia;
5.4. Ainda repousava sobre eles a autoridade de impor as mãos, como sinal de batismo no Espírito Santo. Como dissemos, era novo que irmãos como Estêvão e, agora, Felipe, manifestassem os mesmos sinais que, até há pouco, eram tidos como "exclusivos" dos apóstolos, quais eram, At 8,6 e 6,8, "prodígios e sinais" entre o povo;
5.5. Pois a autoridade dos apóstolos ainda era visivelmente requerida, por providência de Deus, de modo a marcar esse início de testemunho da igreja com respeito a Jesus. Era o referencial de autoridade que, por meio do Espírito Santo, Jesus concedia à igreja, tendo o ministério apostólico como transição;
5.6. Não é definitivo que, para que alguém se converta, outro alguém, hoje, precise impor mãos para que se receba o Espírito Santo. Por isso afirmamos aqui que era transitório e existia como reforço à autoridade dos apóstolos. Aliás, este texto justo confere o autêntico dom do Espírito comparado à farsa de um charlatão chamado Simão, identificado pela proposta que fez, At 8,19;
5.7. Pedro alinha, em sua argumentação e denúncia do charlatanismo e falsa conversão de Simão 5 (cinco) características para identificação do falso ministro de Jesus Cristo e, consequentemente, do falso ministério:
(a) nenhum dom ou nada no ministério de Jesus é negociável por nenhum tipo de moeda, At 8,20, senão unicamente pela graça de Deus;
(b) essa proposta ou essa sugestão de troca denuncia quem a prática ou sugere como mercenário e o predispõe à perdição eterna, At 8,20;
(c) essa postura indica que aquele que pratica, sustenta ou lidera qualquer iniciativa mercantilista dessa natureza não tem parte nenhuma no autêntico ministério de Jesus, assim como não tem reto o coração, diante de Dsus, At 8,21;
(d) tal sugestão parte de alguém incrédulo, segundo identifica Pedro, que denuncia essa intenção como maldade explícita e propõe uma única saída honrosa e possível: arrependimento é conversão, At 8,22;
(e) a análise do apóstolo Pedro enxerga em que cilada está quem partilha e/ou compartilha esse e desse tipo de "ministério" ou o promove: está em "fel de amargura e laço de iniquidade", At 8,23, duras palavras, certamente conferem com 2 Tm 2,26. 
       Embora Simão tenha perdido intercessão por ele, não sabemos se veio a, de modo legítimo, arrepender-se, At 8,24, enquanto que Pedro e seus companheiros prosseguiram em sua campanha evangelística por toda a Samaria, At 8,25.
     Felipe experimenta uma outra ação do Espírito Santo inédita, que bem ilustra, a partir da providência de Deus, a urgência da pregação do evangelho.
   Neste trecho, At 8,26-40, conheceremos uma verdadeira conversão e batismo baseada na leitura das Escrituras, por um expediente inusitado, em que num anjo envia Felipe a uma estrada deserta, porém com endereço definido para a evangelização.
     Ao final da conversa com o Eunuco, Felipe é arrebatado pelo Espírito Santo, e ganha o rumo de evangelização até chegar a Cesareia, a cidade de Cornélio.

4. A conversão propriamente dita
      Em At 9,3-6 está descrita, objetivamente, a maneira como Deus resolveu confrontar Paulo. Ele viu um brilho que o cegou fazendo-o, literalmente, cair. E ouviu a voz de Jesus que com ele falava. Paulo vai, pelo restante de sua vida, lembrar dessa sua experiência, associando-a também ao chamado específico de Jesus em sua vida.
      A mesma voz soergue o apóstolo é lhe indica um endereço, em Damasco, onde será mais detalhadamente orientado. O que ocorre em At 9,8-19. Está parte se subdivide entre a relutância de Ananias, At 9,10-16, as orientações dadas ao novo convertido,, At 9,17-20.
      Como destaque, vale lembrar a justificativa de Deus para o argumento de Ananias, pelo medo que nutria por Saulo, At 9,15-16:
"Mas o Senhor lhe disse: Vai, porque este é para mim um instrumento escolhido para levar o meu nome perante os gentios e reis, bem como perante os filhos de Israel;
pois eu lhe mostrarei quanto lhe importa sofrer pelo meu nome".
       E plenamente Paulo correspondeu, como a continuidade da história em Atos indica, assim como as cartas de mais da metade do Novo Testamento confirmam. 


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