quinta-feira, 19 de outubro de 2023

Certo dia

Adriele, Wisley Filho ao colo, com
Patric (+12/10/2017) e Jonatan (+17/10/2023), primos entre si assassinados em assalto.

 Certo dia, saí sem rumo. Porque alguém me dizia que era fácil encontrar Deus. Mas eu sufocava com tudo o que era triste.

   Eu pensava, não posso ser um cínico. Alguém indiferente ao sofrimento alheio. E eu via gente anestesiada para o sofrimento e ainda gente anestesiada com, isto é, acostumada a sofrer.

  E via aqueles que provocavam o sofrimento nos outros seguindo impunes. E quem deveria cobrar deles, na proporção do mal que causavam, esses então indiferentes.

   Isso me causou tanto mal, que eu achei que ia ficar doente, por dentro, revoltado, amargurado, cheio de ódio. Eu então comecei a pensar qual seria ou se havia um remédio.

   Porque o mal, então, que via neles, com o meu desejo de vingança, tudo somado, ia me fazendo igual. Eu, se pudesse, seria ainda mais mau, eu seria pior. Eu saí assim.

   Para mim, ser alegre, sorrir, então, seria como estar dopado, entorpecido, sob efeito de uma droga qualquer, ainda que somente o álcool. Minha alegria não seria, nunca mais, verdadeira.

   Em mim, o mal havia vencido. O sofrimento me dobrou, fiquei prostrado. Se alguém visse meu riso, não estaria vendo meu coração. Seria tudo mentira. Então, pensei: somente a vingança me trará de volta a paz.

   Foi então que alguém me lembrou da cruz. Disse que no caminho até Deus, há uma cruz. Eu não entendi. Explicaram: Deus deu o Filho dele ao mundo. Como assim, perguntei?

   Explicaram: Jesus Cristo é o Filho de Deus. Deus o deu ao mundo, e eles o mataram crucificado. Ora, mas quem o matou? Todos os que o rejeitaram. Como assim rejeitaram? Não era o Filho de Deus?

   Quem passou a odiá-lo. Sem motivo. Aliás, não há motivo para odiar. Assim o Filho ensinava. Mas odiaram-no sem motivo. Rejeitaram-no e o mataram. Havia quem não queria matar? Sim, havia, mas era uma minoria. A maioria quis matar.

   Essa história acabou? Não. O mal nunca vence. Mas não mataram o Filho de Deus? O mal então venceu. Não venceu. Ele ressuscitou. Venceu a morte. Ela é o pior mal. Ela é a maior dor. E o que foi feito dos que mataram o Filho de Deus?

   Ele perdoou. Como assim perdoou? Deu uma nova chance. Caso se arrependessem. Mas arrependimento não paga o preço da vingança. Deus paga todo o prejuízo. O Filho de Deus pagou todo o preço, inclusive o preço da vingança.

   Então quem matou fica impune? Não. Mas a vingança pertence a Deus. Porque somente Deus para tirar de nós a mágoa que nos consome. Essa vitória do mal, que invade nossas vidas, para nos fazer maus, igual a eles, essa mágoa somente Deus retira.

   Ora, mas por que Deus permite a maldade? Por que uma maldade maior do que a minha, de que não sou capaz de fazer, me atinge? Devasta a minha vida. Fica um vazio onde estava quem eu ainda amo.

   Não há razão e reposta para a maldade. Só sabemos que não vem de Deus. E não queremos, por vingança, ser tão maus como são eles. Nem ainda pior do que eles. Então deixa para Deus a vingança.

   Mas sempre, sem nunca esquecer que Deus não é vingança. A nossa sede de vingança. Deus é amor. E este é o remédio. Deixa perdurar o amor. Quem prevalece, na vida de quem não rejeita o Filho de Deus, é o amor.

   Porque Deus amou o mundo de tal maneira, que deu o seu Filho unigênito. E ainda que o assassinassem na cruz, perdoou. Deu chance de arrependimento. Arrependimento é quando se deseja nunca ter sido mau.

   Mas e as consequências do mal? De novo, Deus paga o prejuízo. Não se deixe vencer pelo mal. Vence o mal com a bondade de Deus. Fique leve. Depõe esse peso. Larga de mão essa carga. Você não vai estar traindo a memória de quem foi bom.

   Mas vai dar a Deus o espaço de ação que é de Deus. Ele vai trazer alívio. Paz. O amor de Deus excede todo o entendimento. Eu quero ser tomado do amor de Deus, que dEle é toda a plenitude.

   Um dia saí por aí, desconsolado. Arrasado. Sem mais ser eu. Então, falaram de Deus para mim. E eu perguntei mas onde? Então disseram que havia uma cruz no meio do caminho. Lugar de violência, sim, da parte dos homens, mas também de amor, agora, da parte de Deus.

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