quarta-feira, 12 de janeiro de 2022

Fra(n)camente 2 - Vitupério

 "Saiamos, pois, a ele, fora do arraial, levando o seu vitupério". Hebreus 13:13.

     Vitupério provém do latim vituperiu, pelo radical vituper-, ligado ao verbo vitupēro. Mais uma daquelas palavras estreitamente associadas ao ser humano porém, definitivamente, repudiadas pelo que revelam de nós, em sua etimologia.

     Significa "descobrir defeitos em", "denegrir, censurar, depreciar". Trata-se de um radical aparentado com vitium, "vício". Por onde nos vem "vício, defeito, falha, imperfeição". Ora, quem visita, ou quando, displicente e prazerosamente, essa seara?

    Como destaca o profeta Obadias, há, sim, folga, alegria e euforia em descobrir, nos outros, essas "qualidades depreciativas". É ele que profetiza: "Mas tu não devias ter olhado com prazer para o dia de teu irmão, o dia da sua calamidade; nem ter-te alegrado sobre os filhos de Judá, no dia da sua ruína; nem ter falado de boca cheia, no dia da angústia". Obadias 1,12.

    Por que? Porque na condição humana todos, um dia, aliás, por repetidos dias experimentamos calamidade, ruína e angústia. Daí a razão por não se alegrar quando identificar no outro tal depressão. "Afronta, injúria, acusação infamante", enfim, "palavra, atitude ou gesto que tem o poder de ofender a dignidade ou a honra de alguém".

     Porém, flexibilizando as justificativas, alguém dirá: "Nunca vilipendiei ninguém. Só acuso quando tenho certeza", plagiando a humorista. Mas negar que se alegrou com a desdita alheia, ou folgou em descobrir no outro o seu vício, isso é muito mais frequente e muito mais difícil de se negar.

    Socorre-nos o autor anônimo da Epístola aos Hebreus. Quando aponta para o vitupério nosso de cada dia. E nos alegra quando diz que, no lugar da vergonha, fora da cidade, onde crucificaram Jesus, saiamos de forma assumida, em direção a Ele, não apontando no outro, mas franqueando em nós mesmos a nossa vergonha.

     Portanto, a receita do encontro com Jesus é assumir que carregou sobre Si tudo o que, em nós, seja dose certa do vício, mais exata ainda do que aquela a nós atribuída. Olhe-se no espelho. Vitupere-se e carrega contigo ao encontro de Cristo. Mas terá de fazer isso saindo da cidade em direção à periferia.

     Definitivamente, Jesus nos faz mergulhar, para logo depois, então, resgatar-nos de escaninhos íntimos que não gostamos de admitir que são nossos, tanto quanto folgamos de alegria ao vê-los em outrem.

    Vergonhoso. Carrega, então, essa vergonha para fora da cidade e caminha em direção à periferia, onde Jesus está. O Gólgota é o lugar de nossa salvação. Cuidado: não gostar de frequentar a tua periferia pode significar que ainda não entendeu o que significa salvação.

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