segunda-feira, 14 de novembro de 2022

A identidade da igreja no diálogo de seus textos - 2

 

    A chamada regra áurea da interpretação bíblica é que Bíblia interpreta Bíblia. O diálogo com os textos bíblicos, assim como o o diálogo texto a texto é o primeiro passo para os demais procedimentos de interpretação.

   Podemos fincar pé na oração sacerdotal de Jesus, Jo 17, entre outros trechos do Evangelho de João, para checar os principais fundamentos da igreja, diretamente relacionados a sua identidade.

   Ela se configura na busca pela identidade com o Pai. E há reflexos dessa interpretação nas cartas paulinas, por exemplo, quando escreve aos Efésios em 5,1-2a:

    "Sede, pois, imitadores de Deus, como filhos amados; e andai em amor, como também Cristo nos amou". Por João 15,10, em sua exortação sobre o amor, Jesus afirma outro fator de identidade da igreja:

    "Se guardardes os meus mandamentos, permanecereis no meu amor; assim como também eu tenho guardado os mandamentos de meu Pai e no seu amor permaneço." A igreja é aquela que permanece no amor de Jesus, do mesmo modo que Jesus permanece no amor do Pai. E Deus é amor, 1 Jo 4,8.

    E em Jo 17,20-21, Jesus afirma ser decisivo para o testemunho da igreja no mundo a comunhão que o Espírito promove. A igreja é uma construção do Espírito em nós, obra aperfeiçoada pelo próprio Deus, em Pessoa, Fp 1, 6. A Trindade opera na igreja e pela igreja.

    "Não rogo somente por estes, mas também por aqueles que vierem a crer em mim, por intermédio da sua palavra; a fim de que todos sejam um; e como és tu, ó Pai, em mim e eu em ti, também sejam eles em nós; para que o mundo creia que tu me enviaste."

    Aqui Jesus intercede pela comunhão, junto ao Pai. E afirma três aspectos dela em sua oração: 1. Igreja é a fim de que todos sejam um; 2. O modelo dessa comunhão é dado, do mesmo modo que Jesus e o Pai têm comunhão; 3. E termina afirmando que igreja é comunhão com o Pai, pelo Filho, privando dessa comunhão no e como no Pai e no Filho.

    A identidade do testemunho da igreja no mundo somente vai se configurar se essa notável comunhão for genuína, promovida pelo Espírito, refletida na ação de Deus Pai, Filho e Espírito Santo na Igreja. Esta é a construção sobre a "pedra angular", Jesus, à qual Pedro se refere, 1 Pe 2,5-10.

   É pela comunhão que a igreja exerce entre si, pelo Pai, por meio do Filho, na plenitude do Espírito que é, como Paulo afirma, em Ef 3,16-18, que o mundo vai reconhecer Jesus Cristo nela operante:

     "...para que, segundo a riqueza da sua glória, vos conceda que sejais fortalecidos com poder, mediante o seu Espírito no homem interior; e, assim, habite Cristo no vosso coração, pela fé, estando vós arraigados e alicerçados em amor, a fim de poderdes compreender, com todos os santos, qual é a largura, e o comprimento, e a altura, e a profundidade."

    A identidade da igreja, portanto, também sigfica o testemunho que dá a respeito de Jesus Cristo. Retornando a João 15,26-27, lemos: "Quando, porém, vier o Consolador, que eu vos enviarei da parte do Pai, o Espírito da verdade, que dele procede, esse dará testemunho de mim; e vós também testemunhareis, porque estais comigo desde o princípio."

   O Espírito dá testemunho juntamente com a igreja. Em Atos 5,32, os apóstolos afirmam isso: "Ora, nós somos testemunhas destes fatos, e bem assim o Espírito Santo, que Deus outorgou aos que lhe obedecem." O Espírito legitima o testemunho da igreja, age nela e por ela, por meio dEle, Cristo habita em nós.

    Em Atos 1,8 Jesus define a prioridade e missão da igreja, consequentemente sua identidade como testemunha de Jesus: "...mas recebereis poder, ao descer sobre vós o Espírito Santo, e sereis minhas testemunhastanto em Jerusalém como em toda a Judeia e Samaria e até aos confins da terra."

   E Jesus o faz, contrapondo a agenda da igreja à dos apóstolos, que julgavam legítimo pedir libertação política para Israel do jugo romano. Advertência para o erro clássico que, desde Constantino, imperador romano do século IV, atrelou a igreja ao governo humano.

    Bajular o governo humano, elegê-lo como alvo de prioridades para si mesma, ambicionar dividir com ele o poder humano, tentação com que Satanás sugeriu a Jeusus reinar sobre o mundo que, ao contrário do afirmado, não pertence, mas jaz no Maligno.

   Jesus venceu essa tentação e manteve Sua agenda. A igreja tem sua agenda. A agenda da igreja é sua identidade com Jesus e a urgência do ministério a realizar. Em João 17,10-11, Jesus afirma, com referência ao Pai: "...ora, todas as minhas coisas são tuas, e as tuas coisas são minhas; e, neles, eu sou glorificado. Já não estou no mundo, mas eles continuam no mundo, ao passo que eu vou para junto de ti. Pai santo, guarda-os em teu nome, que me deste, para que eles sejam um, assim como nós."

   Portando, a igreja tem recebido do Pai, por meio de Jesus, tudo o que supre sua identidade e ministério. Pertence ao Pai, Jesus é mediador e alcança a igreja. A igreja tem agenda própria: cumprir no mundo a missão que o Pai legou ao Filho, inacabada, com autoridade de Jesus para a completar.

    A identidade da igreja reside na vivência do amor e no exercício da comunhão, para o testemunho de Jesus. A igreja tem uma missão. A igreja tem no mundo uma agenda. A Bíblia configura para ela essa verdade.

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