domingo, 22 de março de 2020

A eira de Araúna

Basta, retira a mão. O Anjo estava junto à eira de Araúna, o jebuseu. 2 Samuel 24:16

      Algumas pessoas argumentam que Deus não existe porque, se assim o fosse, interferiria no mundo, para frear a maldade humana. Ou qualquer calamidade que ceifasse vidas. 
     Um dos argumentos mais estúpidos. Pelo menos por três razões: (1) transfere a Deus a responsabilidade por nossa maldade; (2) burla um, senão o maior bem, mal compreendido e não vivenciado pelo ser humano, que é a liberdade; e (3) Deus não é patrono das calamidades. 
     Toda a humanidade herdou a síndrome de Caim, a quem Deus disse, "tua maldade é desejo contra ti, mas a ti cumpre dominar". O instinto homicida está presente em todos nós. Por isso, a culpa dos crimes não é de Deus. 
      E quanto aos microrganismos ruins, ora, não dizem que somos fruto do acaso? Portanto, a geração deles é espontânea e estão na defesa de seu direito à vida. Se nos encontram pela frente, é acidente para nós: para eles, está em sua agenda. 
     Sarah Kalley, congregacionalista britânica que iniciou, com o marido Robert, a escola dominical com crianças no Brasil, em Petrópolis, RJ, em 1855, acertou em sua poesia: "Sentimentos orgulhosos não convêm a criminosos salvos pelo amor".
     Bobagem negar que somos maus com o semelhante, principalmente o mais fraco e discriminado ou diverso de nós, em ideologia, cor, raça, religião, gênero, nível social ou qualquer outro capricho sem sentido, porque pratica-se maldade com ou sem motivo, por puro prazer, colocando-se a culpa em Deus.
      Sim, Deus existe, é sensível e atua por amor e por bondade. Não somos mais sensíveis do que ele ao sofrimento humano. 
      Na história bíblica de Davi ele, desta vez, estava tão sem razão, que até Joabe, mau caráter e sem escrúpulos, tinha razão no conselho que deu: 
      "Ora, multiplique o Senhor, teu Deus, a este povo cem vezes mais, e o rei, meu senhor, o veja; mas por que tem prazer nisto o rei, meu senhor?". 2 Samuel 24:3
     Costuma-se falar de Deus como se fosse alguém, algum e até algo sem opinião. Vivemos tempos em que a defesa dos direitos individuais, às vezes, até, em nome de interesses coletivos, está tão exagerada, que até a opinião de Deus terá de se submeter a esses "direitos". 
     Teremos de fazer a releitura desse texto, para apresentar aos mais exigentes um Deus recauchutado e adaptado às exigências atuais, porque na história Ele disse para Davi não levantar o censo do povo.
    Davi teimou. O mau caráter Joabe aconselhou o certo. Davi fez o que quis. Ao final do censo, que até o IBGE aqui, neste ano, já cancelou, Davi teve, de novo, taquicardia, que acontecia com ele quando desconfiava que havia contrariado o Altíssimo. Porque tinha o temor do Senhor. 
    Deus mandou Gade propor o castigo: 7 anos de fome, 3 meses nas mãos do inimigo ou 3 dias de peste. Três tipos de assolações que a humanidade é veterana em experimentar: a fome, a guerra e a epidemia. Davi disse o que o seu perfil de experiência com Deus bem definia: 
    "Estou em grande angústia; porém caiamos nas mãos do Senhor, porque muitas são as suas misericórdias; mas, nas mãos dos homens, não caia eu". 2 Samuel 24:14.
     Dos 800 mil contados, quase o dízimo morreu pela peste, cerca de 70.000. Se o corona matar quase o dízimo, no mundo, serão quase 700 milhões.  Mas a taxa de mortandade é baixa, não chega a 4%. Serão, então, menos do que 280.000. 
     E Deus, em sua sensibilidade?  Ele existe mesmo? É castigo? Quando dirá, então, ao anjo: "Basta, retira a mão"? Algumas lições a aprender:
1. Coronavírus não é castigo de Deus. 
2. O apocalipse não está aí, começando: sempre esteve, está continuando. Chame "Apocalipse now" (não o nome do filme de 1979, a que assisti duas vezes, mas o real, que está em curso).
3. Apocalipse agora (e sempre) é outra  síndrome que a humanidade carrega consigo: esta, de autodestruição.
4. Muita coisa mata mais do que o COVID-19. Este nos assusta, porque temos medo de que nos mate: as outras coisas que matam, acreditamos, vão matar o vizinho, nunca a gente. 
5. Há quem perca, mas há quem ganhe com a pandemia. E assim caminha a humanidade (outro filme, este já é de 1956, um ano antes de eu nascer).
6. Se alguém acha ridícula a ideia de que o vírus foi inventado: pelo EUA, que injetou na China; ou pela China, que injetou nos EUA (e a Rússia está rindo, por fora), não por essa historinha, mas por muitas outras está comprovado que esse povo aí, para lá ou para cá, também não têm escrúpulos. Como Joabe é a maioria das autoridades mundiais: manipulam o poder, sem nenhum caráter. 
7. Vamos encarar esse choque de realidade. Aprender o máximo que pudermos sobre este e outros vírus. Pôr em prática nossa vivência cristã. E aprender mais da conversa final de Davi com Araúna:
7.1. "Por que vem o rei, meu Senhor?" Davi vinha marcado por aprender com Deus. Vinha de uma calamidade, com coração ferido por arrependido, dependente e dadivoso. Nosso coração precisa sempre de mudança. Ainda que seja por causa de uma calamidade.
7.2. "Para comprar de ti esta eira, a fim de edificar nela um altar ao Senhor, para que cesse a praga de sobre o povo". Sempre é motivo para edificar altar ao Senhor. A samaritana aprendeu que todo lugar, em todo o tempo, é para erguer altar ao Senhor, não só porque a praga bate à nossa porta.
7.3. "Tome e ofereça o rei, meu senhor, o que bem lhe parecer [...] Tudo isto, ó rei, Araúna oferece ao rei; e ajuntou: Que o Senhor, teu Deus, te seja propício". Araúna enxergou o valor da disponibilidade do rei e se associou a ela. Pelo mundo afora, devemos marcar os outros com a mesma comunhão de disponibilidade para oferta total ao Senhor, que se agrada do coração voluntario;
7.4.  "Porém o rei disse a Araúna: Não, mas eu to comprarei pelo devido preço, porque não oferecerei ao Senhor, meu Deus, holocaustos que não me custem nada". Aqui não significa trocar com Deus um favor pelo outro, mas entrega por entrega. Deus se deu por nós em Jesus, igreja que ele comprou com seu sangue. No íntimo, somos como Abraão? Deu o filho, como símbolo de dar tudo, ou fazemos escambo com Deus? 
7.5.  "Edificou ali Davi ao Senhor um altar e apresentou holocaustos e ofertas pacíficas. Assim, o Senhor se tornou favorável para com a terra, e a praga cessou de sobre Israel'.
      Vamos erguer mais este altar. Neste tempo. Vamos dedicar nossa vida, sem nenhum interesse, porque "um morreu por todos e os que vivem, não mais vivam para si mesmos", a não ser o interesse do amor. 
      Pode ser que Deus diga logo ao anjo que "Basta, retira a mão". Pode ser que uma oração nossa antecipe porque, como diz Tiago, em 5,16 (outro cara com um tremendo senso prático, essencial nessas horas), "Muito pode, por sua eficácia, a súplica do justo".
    Mas pode ser que não. Então, vamos seguir, não assumindo a calamidade como sina, mas como saga: será mais uma história de fé em nossa vida.

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