sexta-feira, 15 de março de 2024

Charla misionera

 

   Eu havia pensado numa conversa, de missionário para missionária. Mas tinha dúvida. Porque há uma diferença de 50 anos, ou mais. O que um velho teria a dizer a uma menina de 15 anos?

   Mas há algumas identidades. Começa pela amizade com o avô, a condição de pastores e nossa condição de troca do lugar de nascimento, por uma terra distante.

   A sua, ainda mais distante. Aqui, no meu canto, onde estou já há quase 30 anos, ainda é Brasil. Remoto, mas o mesmo país. As estranhezas são menores.

  Aqui e ali se encontra gente do sul. Cariocas mesmo, paranaenses, paulistas do interiorrrrr e até sul-riograndenses. Mas lotado de acreanos, gente muito mais acolhedora. Mas o que se encontra em Espanha? 

    Você está descobrindo. Que apego tem Deus pelas gentes, que tanto nos fascina? Como nos coloca assim, em condições de tanta estranheza, para que encontremos caminhos de amor?

   Eu lembro de seu avô, tentando entender a minha escolha. E até hoje eu olho å volta, para a mesma paisagem de 1993, retocada aqui e ali, e me pergunto o que nela ainda me atrai.

   Ruas acanhadas. Cheguei aqui, havia dois edifícios, um de 8 e outro de 5 andares. Duas pontes sobre o rio Acre, uma de 1970 e a outra de 1974, a primeira de ferro, a segunda de alvenaria.

   Iluminação amarelada, ainda por motores a diesel. Certa vez, era o feriado de 12 de outubro de 1993, Regina grávida de Isaac, 3 meses, eu dei de cara com a paisagem da Estação Experimental.

   Nome de bairro de uma estação agrícola que não deu certo. O pessoal foi invadindo, para arranjar onde morar. História de 80% dos bairros daqui. Eu enxerguei a Estação.

  E disse para mim: como vim parar aqui? É para cá que venho? Trazer a esposa, sem ainda ter nem um ano de casado? Nunca mais consegui ver assim a Estação.

   Deixou de ser remoto e distante. Deixou de ser miúdo e acanhado. E a gente deixou de ser estranha e desconhecida. Ainda me falta aprender amar como Deus ama.

   Noutro dia, estava dentro da casa de meu filho, ele me fez um café, sentado ao lado da esposa dele, que me promete um(a) primeiro(a) neto(a). Desculpe essa conversa de velho.

   Ele veio no colo da mãe, com 8 meses de nascido. Loucuras nossa. Eu e teu avô cismamos de fazer Rio-Campo Grande, ainda no meado da década de 80.

  A gente via um cartaz rabiscado Porto Velho, no para-brisas dos ônibus Andorinha. Aprendemos que Campo Grande, Mato Grosso do Sul, era baldeação para gente que ia até Porto Velho, Rondônia.

  Teu avô olhou desconfiado. Não vamos a Porto Velho, ele ameaçou: você tem mania por aventuras missionárias. Tínhamos. Temos. De onde vem esse vírus?

  Eu acho que Deus tem mania missionária. Chegamos a Rio Branco. Nelson Rosa, que neste ano faz 40 anos de Acre, disse que, talvez, fosse tempo de fazer missões em Minas Gerais.

   O casal Rosa nunca deixa de ser missionário. Deus nunca deixa de ser missionário. Deus é amor. E aí, eu disse ao seu avô: se ele sai, eu entro. Se ele vai, eu venho.

  Ia esquecendo de dizer: nessa saga missionária, até o interior de Minas, o casal Rosa passou em Porto Velho e deixou lá plantada uma igreja. Toma mais essa, Paulo Leite.

  Nunca sabemos direito por que viemos. Tentar conhecer o amor, como diz Paulo, excede todo o entendimento. Mas ele também diz que faz ser tomado por toda a plenitude de Deus.

  Julia, seja essencialmente missionária, como Deus. Em amor, tomada por toda a plenitude de Deus. Amor é a reposta de Deus a esse mundo. E nós, o rosto de Jesus para todas as gentes.

   Não sei se aos 15 se sabe muito sobre isso. Eu, com 66, não sei se aprendi muito. Porque o amor de Cristo excede todo o entendimento.

3 comentários:

  1. Me emocionei meu irmão. Me emocionei.Fazia tempo que não sentia esse tão nobre sentimento.

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  2. Abração, meu caro. Tentamos sentir tudo o que vocês sentem, junto com vocês.

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