segunda-feira, 15 de março de 2021

Declaração de amor

     "Uma oração ao Deus da minha vida". O salmista deixa escapar essa frase, no salmo 42, no final do versículo 8. Trata-se de uma declaração de amor.

    Pelo fato, sim, de nomear o Altíssimo como "Deus da minha vida", porque a vida é um ato do amor de Deus. Mas também por mencionar "uma oração".

    Porque oração é, também, um ato de amor. Porque a oração interpela o Deus de amor. A primeira oração que alguém faz, é para se encontrar com o amor de Deus.

    Porque se alguém ora, crê. Portanto, compreendeu a principal oferta de Deus ao homem, o Seu amor. Todas as demais falas do salmo são trechos da oração maior do salmista.

     Muitos podem ser os assuntos de uma oração. Mas se, como diz Paulo, o apóstolo, que se "põe de joelhos diante do Pai", como ele mesmo confirma em sua oração, é para falar de amor.

    "A minha alma tem sede de Deus". Antes de conhecer Deus, todo homem ou mulher tem essa sede. Pode ainda não saber e, reconhecendo, pode até lutar contra.

     E quem admite e sacia, como aquela mulher samaritana, sabe que a sede só aumenta. O salmista enfrentava grande angústia, a ponto de dizer que se "alimentava de lágrimas" e que elas mesmas lhe perguntavam, vejam bem, continuamente: "E Deus, onde está?".

     Ele então reconhecia que estava sedento. Era por isso. E se perguntava, "quando (então), irei e me verei perante a face do Deus vivo?". Após uma fase de intenso sofrimento, Jó afirmou que então via Deus como nunca antes houvera.

     Veja bem, estamos falando de Jó, definido pelo próprio Deus como "íntegro, reto, temente a Deus e que se desviava do mal". Provavelmente, por nossa avaliação, alguém bem íntimo do Altíssimo.

       Mais interessante ainda é o salmista dizer "quando irei e me verei perante a face de Deus?", porque é Deus, por amor, que vem ao nosso encontro e nos revela Sua face. Mas deve ser porque, muitas vezes, como a menina do conto de Lispector, "Felicidade clandestina", a gente se perde de Deus dentro da gente mesmo. Bendita sede.

     O salmista, na oração, afirma que "sente, dentro de si, abatida a sua alma". Ele reconhece e avalia sua condição. Expressa sua sensação como alguém sobre quem passaram "todas as vagas e ondas", da parte de Deus.

    Literalmente comparado ao profeta Jonas, talvez sem nunca ter entrado no mar. Mas essa era a sua sensação. "Um abismo chamava outro abismo", enquanto com fragor essas catadupas de ondas passavam sobre ele.

     Devemos interpretar esse salmista como alguém lúcido, ou do tipo que exagera um pouco em sua espiritualidade? Ainda vai afirmar que era com "ossos esmigalhados" que se sentia, afetado pelo escárnio dos inimigos e candidatos a opressores, enquanto ouvia o insulto desses adversários.

     E Deus, onde? Para logo dizer, de Deus tenho recebido misericórdia, o mesmo que amor, durante o dia, e cântico, como disse Jó, que a noite lhe inspirava, e então, nesse contexto, como fôlego, era a sua oração.

    Deduz e decide, encerrando a oração com a frase ou tema do começo: "Por que abatimento?". Coisas da alma. Que remédio? Espera em Deus. Louvor é resposta consciente ao que Deus opera em nós, por nós e ao nosso redor. É resposta consciente ao testemunho do que Deus realiza.

     Em meio à oração, o salmista já se havia recordado do muito que Deus havia realizado em outras ocasiões, oportunidade de "gritos de alegria, louvor e multidão em festa". Não é tempo de festas. Agora, são um desrespeito.

     A alma pode se sentir abatida. Isso até revela uma sensibilidade dela. A ponto de se perturbar. Nessa ora, "uma oração ao Deus da minha vida". E espera. Nunca frustra esperar em Deus.

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