quinta-feira, 26 de novembro de 2020

Desmantelo e inoperância: quando a palavra mente. A profecia de Jeremias e o descrédito do discurso

    No texto bíblico, a vocação ou chamado de Deus são perícopes bem circunscritas, indicando a primeira e surpreendente fala de Deus ao vocacionado. 

    Vocacionar significa chamar. Deus escolhe e convoca.  Desde Noé, a quem Pedro Apóstolo chama de profeta para a sua geração, a Abel, a respeito de quem o autor de Hebreus diz que, mesmo depois de morto, ainda fala.

    Ainda que seja expresso por uma única frase, como ocorre, por exemplo, aos profetas menores, "palavra do Senhor que veio a", e segue o nome do profeta, esses homens recebem de Deus um chamado e autoridade para falar em nome dEle.

     No Novo Testamento, Paulo Apóstolo vai dizer, aos coríntios, que toda a igreja deve profetizar. E define profecia como "falar aos homens" tendo, como conteúdo, "edificação, exortação e consolo".

     No grego, oikodomene, paraklesin e paramuthian que, respectivamente, significam "dar (a vida) estrutura", "pôr-se junto advertindo" e "encorajamento".

     Portanto, o tripé da profecia que a igreja, em conjunto, deve praticar e, para isso, buscar preparo e assistência do Espírito Santo, implica construir, estruturar vidas, colar junto incomodando, se for o caso, e conceder encorajamento. 

     O profeta se interpõe, para dizer que Deus edifica, Deus se coloca ao lado, para até importunar, admoestar, que significa "estar ao lado molestando", ações no sentido de exortação, assim como o próprio Deus, em Pessoa, consola.

      A profecia existe para advertir de que Deus se interpõe, Ele mesmo, diante de cada um dos viventes, é assim desde sempre, desde o Éden, pela viração do dia. Com o derramamento do Espírito, como indicou Joel em sua profecia, destacado por Pedro, no primeiro sermão após a ressurreição de Jesus, toda a igreja é (ou deveria ser) constituída por profetas, para indicar essa postura e posição de Deus diante dos homens e das mulheres. 

     Voltando ao Antigo Testamento, fosse uma convocação curta, expressa por uma frase, como ocorre, por e exemplo, com Jonas e Abraão, ou perícopes reelaboradas, como ocorre com Moisés, Ezequiel e, em menor escala, com Isaías e Jeremias, as descrições e expressões desse chamado indicam, em linhas gerais, a tarefa do profeta e o contorno da situação a enfrentar.

      A Abraão, uma síntese do que Deus esperava dele, "de ti farei uma grande nação". A Moisés, "vi a aflição do meu povo e desci a fim de livrá-lo", com respeito a Israel, no Egito, e a Jonas, "ir à grande cidade de Nínive e pregar contra ela".

      A Jeremias, "velo sobre minha palavra para a cumprir", expresso na visão de uma vara de amendoeira que dá o seu broto inadvertidamente. E do "rolo compressor" que vem do Norte, detalhado na descrição que Joel já havia feito dos exércitos dos impérios do oriente, assírios, em 722 a. C., e agora, no tempo de Jeremias, a partir de sua vocação ainda em tempos do rei Josias, os babilônios. A visão simbólica que ilustra essa hecatombe é de uma panela que se entorna a partir e na direção que indica o norte.

      Em linhas gerais, esse é o panorama da profecia de Jeremias. Vai reafirmar, em termos políticos, a realidade que se impõe, a partir da Mesopotâmica, do jogo de forças que compõe a geopolítica de sua época e, em meio à constatação dessa ameaça sobre o minúsculo reino de sua gente, delinear o quadro de rejeição da palavra do Senhor, em função dos falsos discursos de ocasião e seus respectivos porta-vozes.  

      Como comentou Paulo Apóstolo aos coríntios, muitas são as vozes no mundo, nenhuma delas sem sentido. Em meio a tantas vozes, destaca-se a de Deus. Cumpre ouvir, distinguindo-a entre todas as demais. 

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