quarta-feira, 7 de dezembro de 2022

Alto e nítido

  "Eu sei, respondeu a mulher, que há de vir o Messias, chamado Cristo; quando ele vier, nos anunciará todas as coisas. Disse-lhe Jesus: Eu o sou, eu que falo contigo." João 4:25,26.

   "Eu sei", falou a samaritana, anônima na Bíblia. Pois bem, há quem não saiba, quem não quer nem saber e quem, simplesmente, nem acredita nisso.

   Mas ela sabia que o Messias (hebraico), chamado Cristo (grego) havia de vir. Mal, quer dizer, bem sabia que estava diante dele. Jesus disse a ela: "Eu o sou, eu que falo contigo".

   Nessa altura, após anos, quem sabe, séculos de tradição, a primeira pergunta besta que se faz é se podemos acreditar na literalidade desse diálogo. Eu acredito.

   A segunda pergunta, para ficar só nesta, é se ainda hoje podemos ouvir de Jesus essa mesma afirmativa, ou seja: "Eu o sou, eu que falo contigo".

   Haveria de ser muito místico quem respondesse afirmativamente. Opcional colocar aqui uma interrogação. Porque, talvez, cara a cara, como foi com essa mulher, a resposta é não.

   Mas ouvir Jesus falando hoje, não cara a cara, mas com a mesma precisão, seria possível? Com interrogação. Ora, em nome dessa posse da fala de Jesus muito, na história, já se fez, com toda a estupidez.

   A Igreja, ao longo dos séculos, quis ser dona dessa fala, quis ter a posse dessa palavra. Foi um erro histórico. Em nome da ortodoxia, muito desatino já se cometeu, aliás, ainda se comete.

    Ouvir Jesus e ouvir interpretações sobre Jesus. O primeiro erro é a usurpação da palavra. Alguém achar-se iluminado, revelado ou individualizado no acolhimento da palavra.

   A própria samaritana compartilhou o que ouviu e a autenticidade do que disse foi atestada pelos que ouviram e creram: "Vinde comigo e vede um homem que me disse tudo quanto tenho feito. Será este, porventura, o Cristo?!". João 4:29.

   E os seus companheiros atestaram: "Muitos outros creram nele, por causa da sua palavra, e diziam à mulher: Já agora não é pelo que disseste que nós cremos; mas porque nós mesmos temos ouvido e sabemos que este é verdadeiramente o Salvador do mundo." João 4:41,42.

   Mediadores aqui são João, o autor do evangelho, a samaritana e seus conterrâneos. Assim chegam a nós as palavras de Jesus. Logo no começo da vida da igreja, Lucas, outra testemunha autoral, afirma: "E perseveravam na doutrina dos apóstolos". Atos 2:42.

   Sim, a palavra de Jesus, que veio por sua boca, chega a nós por meio de pessoas como nós, que viveram na época dele, conterrâneos, mas também estranhos, depois gentes de todas as nações, mas todos testemunhas.

   Caso você não acredite em gente como você, porém, diferentemente, testemunha, não tem como ouvir de Jesus "Eu o sou, eu que falo contigo". Ele chamou de igreja, ekklesia, congregação, grei, grupo essa reunião dos que nele creem.

   Podem se reunir nas varandas do templo de Jerusalém, nas areias do Mar de Tiberíades, no jardim das oliveiras. Ou em casas, como com os Kalley, até em túmulos subterrâneos, como na Roma antiga, ou na beira do igarapé, com o casal Rosa, no Acre, em 1984.

   Mas terão ouvido a voz de Jesus. Seguem ouvindo a voz de Jesus. Aloud, como se diz no inglês. Alto e nítido, como se diz no português.

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