sexta-feira, 23 de abril de 2021

Nada, senão somente

 Então, lhes falou Jesus: Em verdade, em verdade vos digo que o Filho nada pode fazer de si mesmo, senão somente aquilo que vir fazer o Pai; porque tudo o que este fizer, o Filho também semelhantemente o faz". João 5,19.

A um só tempo, a medida de Pai e Filho. Neste texto, o apóstolo João expressa a medida da relação que se estabelece entre pai e filho. No caso de Deus e Jesus Cristo, é a relação modelo, exatamente por se tratar desse Pai e do seu único Filho.

É natural o filho tomar o pai como referência. Na falta do pai, haverá falta de referencial e alguma providência urgente deverá suprir essa falta crucial.

A expressão de Jesus define, em essência, a natureza da relação entre pai e filho. E no caso da relação entre Deus e Jesus, trata-se do padrão de perfeição para qualquer relação desse tipo, entre qualquer pai e qualquer filho.

Paulo entendeu isso quando, em Ef 5,1 ele escreve: "Sede, pois, imitadores de Deus, como filhos amados". Ef 5,1. E não é possível dissociar esta afirmação da seguinte, continuação deste mesmo texto: "...e andai em amor, como também Cristo nos amou". Ef 5,2.

A relação entre Pai e Filho se pauta pelo amor. Deus ama intensamente. Deus ama intensamente o Filho. Aqui também percebemos a dimensão que o próprio João, em seu evangelho, exprime, quando diz que "Deus amou... de tal maneira". Jo 3.16.

Entendendo assim, vislumbramos, a um só tempo, a natureza do amor do Pai e o custo, para Ele, de dar o seu Filho unigênito como sacrifício pelo pecado. Desse modo Paulo encerra o texto acima, destacando: "... como também Cristo nos amou e se entregou a si mesmo por nós, como oferta e sacrifício a Deus, em aroma suave". Ef 5,2.

Essa relação íntima de amor entre Deus e Jesus, entre Pai e Filho, é modelo para toda a humanidade. É a relação-padrão de definitiva expressão de amor, modelo para qualquer relação entre pai e filho.

Portanto, a responsabilidade de todo pai é aprender, com Deus, a amar. E não pensemos que Jesus foi um homem diferente, que não precisou aprender, porque Jesus é modelo de aprendizado.

O autor de Hebreus deixa isso muito claro: "... embora sendo Filho, aprendeu a obediência pelas coisas que sofreu e, tendo sido aperfeiçoado, tornou-se o Autor da salvação eterna para todos os que lhe obedecem". Hb 5,8-9.

Portanto, não há, como Jesus, filho que tenha imitado o próprio pai, de modo tão absoluto, tendo aprendido e praticado a obediência de modo tão completo. E não foi somente obediência que Jesus aprendeu.

Em seu Evangelho, João deixa claro também que Jesus aprendeu, com o Pai, o seu amor, praticondo-o intensamente e permanentemente: "Se guardardes os meus mandamentos, permanecereis no meu amor; assim como também eu tenho guardado os mandamentos de meu Pai e no seu amor permaneço". João 15,10.

Jesus é o modelo de filho que guarda os mandamentos do Pai. Isso se chama obediência e, no caso de Jesus, o único caso de obediência absoluta. E o principal mandamento do Pai é o amor. Jesus, igual ao Pai, é o único caso de amor absoluto.

"O filho nada pode fazer nada de si mesmo, senão somente aquilo que vir fazer o pai". Precisamos, carecemos dessa fibra de pais, para que haja essa mesma marca igual de filhos. Jesus, durante toda a sua vida, exercitou obediência e amor. Por isso, o autor de Hebreus afirma que ele foi aperfeiçoado para se tornar o nosso Salvador.

Jesus pôde resistir à cruz, quando no momento máximo de crise, tanto para o Filho, quanto para o Pai, a ponto de clamar: "Eloí, Eloí, lamá sabactâni? Que quer dizer: Deus meu, Deus meu, por que me desamparaste?". Mc15,34.

Amor e obediência, confiança total no Pai e confiança total do Pai no Filho supriram, nessa hora, proporcionando vitória. Obediência ao Pai, confiança no Seu amor e em Sua providência sustentam em todas as horas, principalmente na hora máxima de tribulação.

Mas Jesus também foi exemplo de obediência aos pais humanos. O incidente de seu esquecimento, na jornada de retorno, de Jerusalém à Galileia, exemplifica o modo como o menino assimilava os ensinos da mãe, sobre sua paternidade, e o modo de conviver em relação aos pais terrenos.

Lucas esclarece, nesses dois textos, o primeiro na resposta inteligente de Jesus: "Ele lhes respondeu: Por que me procuráveis? Não sabíeis que me cumpria estar na casa de meu Pai?" Lc 2,49. E o segundo, quando registra a submissão do menino às instruções dos pais humanos: "E desceu com eles para Nazaré; e era-lhes submisso. Sua mãe, porém, guardava todas estas coisas no coração".Lc 2,51.

E como isso contribuiu para o desenvolvimento integral do menino: "E crescia Jesus em sabedoria, estatura e graça, diante de Deus e dos homens".Lc 2,52. A obediência a Deus, o Pai celestial, manifesta-se na objetividade da correspondente e devida obediência aos pais humanos, como ensina o próprio mandamento: "Honra teu pai e tua mãe, para que se prolonguem os teus dias na terra que o Senhor, teu Deus, te dá". Ex 20,12.

Somente Deus pode ensinar obediência que, por si, já é um gesto de amor. Quem ama, obedece. Evidentemente que, quando se trata de pais humanos, pai e mãe, precisam se apresentar como modelo a seus filhos, de modo a que estes possam seguir o padrão da relação: nada fazer de si mesmos, se não somente o que virem fazer os pais.

E o próprio autor de Hebreus, novamente, reafirma que, entre pais humanos e o Pai celestial, há marcante diferença que deve ser reconhecida. "Além disso, tínhamos os nossos pais segundo a carne, que nos corrigiam, e os respeitávamos; não havemos de estar em muito maior submissão ao Pai espiritual e, então, viveremos?". Hb 12,9.

E o modo como somos supridos, pelo socorro de Deus, reconhecendo nossas limitações, e convidados, em amor, a ser participantes da Sua perfeição: "Pois eles nos corrigiam por pouco tempo, segundo melhor lhes parecia; Deus, porém, nos disciplina para aproveitamento, a fim de sermos participantes da sua santidade. Hb 12,10.

Abordando sobre a obediência modelar do filho, em relação ao caráter do pai, não estamos falando exclusivamente de homens. Falamos também de mulheres, porque elas são o contraponto na relação conjugal. Gênesis registra um versículo esquecido ou repetido mecanicamente, sem que se reflita na importância de sua significação.

"Criou Deus, pois, o homem à sua imagem, à imagem de Deus o criou; homem e mulher os criou". Gn 1,27. Homem e mulher são constituídos por Deus à sua imagem e semelhança. A obediência devida ao pai é a mesma devida à mãe, e o compromisso de amor em ser modelo para os filhos é o mesmo, para o pai e para a mãe, exatamente na mesma proporção.

Não existe na Bíblia o modelo de família propagado na sociedade atual, chamado "produção independente", em que se escolhe um(a) reprodutor(a) e o(a) filho(a) é criado(a) por um dos dois. A Bíblia tem um modelo único de família: união heterossexual, monogâmica e indissolúvel.

Basta que um desses três aspectos seja quebrado, para não se tratar do modelo bíblico de casamento e, sim, certamente, uma alteração do padrão, por sua vez devida, exclusivamente, ao expediente humano, fora do padrão bíblico, responsabilidade de quem o praticar e assumir.

A família, segundo o padrão de Deus, é o lugar onde amor e obediência são aprendidos, para que a sociedade disso se beneficie, de modo permanente. Vivemos um tempo de desamor ou falsa identidade do que seja amor. E também um tempo em que a desobediência é tida como virtude.

Quem sabe a igreja possa assumir o desafio de ser exemplo de correção dessa distorção, abrindo a Bíblia para a cumprir e proclamar, porém revestida da autoridade de quem vivencia como padrão em sua própria vida e presença na sociedade. 

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